Sunday, June 14, 2009

Arigato gozaimasu London!

(Finalmente entrando na tão prometida senda dos sabores…)

Não sei se há quem ainda se delicie com coincidências. É algo que consegue sempre deixar-me maravilhada. Ou pelo menos, surpreender-me. Sejamos honestos: no mundo do been there, done that, é raro ter surpresas. Pelo menos daquelas que fazem bem ao coraçãozinho, que nos fazem dar um pequeno (sobre)salto.

Na minha mais recente viagem ao Reino – e não me refiro ao do Lars von Trier (esse fica para outra ocasião e outro post,), mas ao United Kingdom, de sua Majestade Rainha Isabel II – uma pequena coincidência: caminhando por Leicester Square, em busca de uma loja de livros em segunda mão que tem fama de ser uma das melhores – Any Amount of Books, de seu nome – avisto o Café de Hong Kong ao fundo da rua. “Estranho nome este”, penso. Aproximo-me. E eis que do lado esquerdo vejo num restaurante, placas de metal no meio da mesa. “Oh!”, exclamo, pois trata-se de um restaurante japonês. Mas não um qualquer restaurante japonês. Era – e é – um restaurante japonês de okonomiyaki!



Abeno's front



A prova de que aqui só se come okonomiyaki

A coincidência é de grandes proporções. Há coisa de semanas, um amigo – o meu ilustre companheiro de postcrossing (e carreguem lá no link, hein) – pediu-me que escrevesse sobre este delicioso prato japonês difícil de encontrar no Ocidente. Há já um ano que salivava cada vez que recordava as trincas dadas numa bela okonomiyaki, em Osaka. De regresso ao Ocidente, busquei o pitéu. Mas sem sucesso. Ninguém parece ligar muito a esta espécie de pizza/panqueca oriental.

Fiz uma busca, reli o guia do Japão e finalmente descobriu-se uma receita. E escreveu-se sobre o prato. Entretanto, tendo encontrado um inhame açoriano que substituísse o chinês, que serve de base à panqueca, começava a crescer a esperança de ser possível confeccionar, pelo menos, um sucedâneo de okonomiyaki.

Foi então que no meio daquela caminhada londrina surgiu o Abeno, restaurante de okonomiyaki. Estava decidido: o jantar seria okonomiyaki! E assim foi. Entrei, sentei e observei.

Curiosa a composição da clientela do restaurante. Sentada sozinha, remetida para um canto pelo único empregado ocidental – que amaldiçoei por isso – era a excepção que confirmava que a regra: apenas casais jantavam ao balcão. Agora a estatística: a maior parte dos casais tinha um elemento oriental, e na maioria dos casos, o elemento oriental era do sexo feminino.

No meio da minha reflexão, tirando notas e fotografias mentais do lugar, reflectia sobre a última experiência com okonomiyaki. Este restaurante londrino é mais fashion e minimalista que o velhinho e tradicional restaurante de okonomiyaki de Osaka onde saboreei aquela bela panqueca na internacional companhia de falantes de inglês: Ben, oriundo de San Diego, Califórnia, EUA, Mark, caríssimo neozelandês que me falou da concorrência lusitana – neo-zelandesa, Liz, a very nice londoner e Clare, a menina originária de Kentucky, o que, obviamente, lhe valeu umas fracas piadas sobre o KFC. Poverina!

Em Londres, encontrei-me só ao balcão do restaurante, encarando a okonomiyaki e trocando algumas palavras com o empregado/chef que ia confeccionando a minha apetitosa panqueca. Perguntei-lhe pelo inhame e lá me disse, surpreendendo-me com a informação que pouco inhame se adicionava, e ovo, nem vê-lo. Foi produtivo, tendo servido de base para a minha futura aventura na cozinha nipónica. No entanto, o rapaz não sabia que tempura é uma herança portuguesa. Lá tive de lhe explicar um pouco sobre as relações luso-nipónicas, evocando a sábia voz de Wenceslau de Morais. E cito:

“Os japoneses dizem: tempura (de “tempero”, ou de outro termo parecido). Tempura é qualquer artigo de cozinha, frito em azeite; correspondente ao nosso actual vocábulo “fritura”.” (in O Culto do Chá)

Fiquei um pouco triste com a cara desconfiada do moço. Os ingleses desconfiam sempre de um facto deste género, talvez por sermos um país pequeno. Mas a verdade é que, ainda que a milhares de quilómetros de distância e mesmo que separada por séculos, o facto é que conseguimos deixar uma marca nos lugares por onde nós, almas lusitanas, passámos.

E viva o 10 Junho atrasado! Hip, hip, hurra! Contra os bretões, marchar, marchar!